sábado, 4 de fevereiro de 2012

O Gato de Botas

"O Gato de Botas" ("Der gestiefelte Kater") apareceu apenas na primeira edição do Kinder- und Hausmärchen de 1812 dos Irmãos Grimm sendo posteriormente suprimido, provavelmente, por suas origens francesas, já que integrou a coletânea de contos de Charles Perrault, publicada muito antes em 1697. Essa supressão do conto na segunda edição dos contos dos Grimm foi realmente uma pena, pois a história do Gato de Botas se difundiu de tal maneira que ganhou inúmeras versões, incluindo adaptações para o teatro, das quais ressalta-se a versão de Ludwig Tieck (disponível no Projekt Gutenberg) de 1797, além de numerosas versões em desenho animado, das quais as aparições na série de filmes do Shrek e na versão mais recente O Gato de Botas, dedicada apenas a essa personagem, são apenas mais algumas visões desse carismático personagem. A tradução apresentada abaixo é baseada no conto dos Grimm publicado em 1812.



O Gato de Botas

Um moleiro tinha três filhos, seu moinho, um burro e um gato. Os filhos deviam moer, o burro, buscar os grãos e carregar a farinha e o gato, livrar-se dos ratos. Quando o moleiro morreu, os três filhos dividiram a herança entre si: o mais velho recebeu o moinho, o segundo, o burro; o terceiro o gato, nada além lhe restou. Então ele ficou triste e dizia para si mesmo: "Eu fiquei com o pior de tudo, meu irmão mais velho pode moer; meu segundo irmão pode cavalgar sobre seu burro; o que eu posso começar com o gato? Deixe-me fazer um par de luvas de pele a partir de seu couro, assim acabo com isso." "Escute - começou o gato, que tinha entendido tudo o que havia sido dito - você não precisa me matar, para conseguir um par de luvas ruins feitas da minha pele, deixe-me apenas fazer um par de botas, para que eu possa sair e deixar-me ver sob outras pessoas, então você vai ser logo ajudado." O filho do moleiro se admirou, que o gato assim falava, porque justo nesse momento passava o sapateiro! Chamaram-no para dentro e deixaram que ele medisse um par de botas para o gato. Quando elas estavam prontas, o gato as calçou, pegou um saco, encheu-o de grãos, mais um cordão em cima, com o qual se podia fechar, então jogou-o nas costas e andou sobre duas pernas, como uma pessoa, da porta a fora. Naquele tempo, um rei, que gostava muito de comer perdizes, governava o pais: porém havia uma falta no reino, e nenhuma perdiz podia ser conseguida. Toda a floresta estava cheia delas, mas elas eram tão tímidas, que nenhum caçador conseguia alcançá-las. O gato sabia disso e pensou em fazer suas coisas de um jeito melhor; quando ele entrasse na floresta, abriria o saco, espalharia os grãos afastados, mas deixaria o cordão na grama e ele conduziria para trás de um arbusto. Lá ele mesmo se esconderia furtivamente e espreitaria. As perdizes logo vieram correndo, encontraram os grãos e uma atrás da outra saltaram para dentro do saco. Quando já havia um bom número ali dentro, o gato puxou o cordão, enrolou e fechou-o; então, jogou o saco nas costas e foi direto para o castelo do Rei. O sentinela gritou: "Alto! Onde vai?" – "Até o rei" respondeu o gato rapidamente. - "Você é maluco, um gato até o rei?" - "Apenas deixe ele ir, disse um outro, o rei tem sempre muito tempo, talvez o gato o divirta com seus rosnados e disparates." Quando o gato chegou à frente do rei, fez uma reverência e disse: "Meu Senhor, o Conde, daí ele mencionou um longo e pomposo nome, permite-se recomendar ao rei e enviá-lo estas perdizes aqui, que ele tem agora mesmo presas nessa armadilha". O rei admirou-se com as belas e gordas perdizes, não se continha de alegria e ordenou que colocassem no saco do gato tanto ouro de sua câmara dos tesouros, quanto ele pudesse carregar: "Leve isso ao seu senhor e agradeça-o ainda muitas vezes pelo seu presente."

O pobre filho do moleiro, porém, estava sentado em casa à janela, apoiava a cabeça na mão e pensava, que ele agora tinha desperdiçado seus últimos centavos para as botas do gato, e o que isso poderia lhe trazer de melhor. Então, entrou o gato, lançou o saco das costas, desamarrou-o e espalhou o ouro na frente do moleiro: Aí você tem algo pelas botas! O Rei permitiu também lhe cumprimentar e dizer muito obrigado". O moleiro estava feliz com a riqueza, sem que ele ainda pudesse perceber, como ela tinha chegado. Mas o gato, enquanto tirava suas botas, contou-lhe tudo, então lhe disse: "Agora você tem mesmo dinheiro suficiente, mas não pode ficar assim, amanhã vou calçar minhas botas de novo e você deverá ficar ainda mais rico. Eu também disse ao rei que você é um Conde". No outro dia foi o gato, como ele havia dito, com suas botas bem vestidas para a caçada, e trouxe ao rei uma farta presa. Assim iam todos os dias, e o gato trazia todo dia ouro para casa, e era tão querido pelo rei, que lhe era permitido ir para lá e para cá e se esgueirar pelo castelo, por onde quisesse. Uma vez, estava o gato na cozinha do rei e se aquecia perto do fogão, então veio o cocheiro e praguejou: "Eu queria que o rei junto com a princesa estivessem nas mãos do carrasco... Queria ir à taberna e uma vez beber e jogar cartas, mas daí devo levá-los de carruagem para passear à beira mar..." Assim que o gato ouviu isso, foi furtivamente para casa e disse para o seu senhor: "Se você quiser se tornar um conde rico, venha comigo para o mar e se banhe lá." O moleiro não sabia de nada, do que deveria dizer, porém seguiu o gato, foi com ele, despiu-se, completamente nu, e pulou na água. Mas o gato pegou suas roupas, levou-as além e as escondeu. Mal ele tinha feito isso, veio o rei até ali conduzido; o gato começou imediatamente a se lamentar infeliz: "Ah! Todo piedoso rei! Meu senhor se banhava aqui no mar, então veio um ladrão e lhe roubou as roupas, que jaziam na margem, agora está o Senhor Conde na água e não pode sair, e se ele ficar lá por muito tempo, irá se resfriar e morrer." Como o rei ouvia isso, fez uma parada e um de seus homens deveria disparar de volta e buscar uma das roupas do rei. O Senhor Conde vestiu as esplendorosas roupas, e porque o rei de qualquer modo estava afeiçoado por ele, por causa das perdizes, que ele pensava tinham lhe sido apanhadas, assim deveria o conde se sentar junto com ele na carruagem. A princesa também não estava zangada com isso, pois o Conde era jovem e bonito, e ele agradava-a muito bem.

O gato, porém, estava à frente e chegou a uma grande campina, onde estavam mais de cem pessoas e preparavam o feno. "Hei, pessoal, de quem é esse campo?" perguntou o gato. - "De um grande feiticeiro." - "Escutem, agora o rei passará brevemente por aqui, se ele perguntar, a quem pertence esse campo, assim respondam: ao Conde; e se vocês não fizerem isso, vão todos apanhar até a morte." - Em seguida, o gato foi mais longe e chegou a um campo de grãos, tão grande, que ninguém deixaria de notar, lá haviam mais de duzentas pessoas e cortavam o centeio. "Hei, pessoal, de quem são esses grãos?" - "Do feiticeiro" - "Ouçam, agora o rei passará por aqui brevemente, se ele perguntar, a quem pertence o centeio, assim respondam: ao Conde, e se vocês não fizerem isso, vão todos apanhar até a morte." - Finalmente chegou o gato a uma esplendorosa floresta, lá estavam mais de trezentas pessoas, que cortavam grandes carvalhos e faziam lenha. - "Hei, pessoal, de quem é essa floresta?" - "Do Feiticeiro" - "Ouçam, agora o rei passará por aqui brevemente, se ele perguntar, a quem pertence a floresta, assim respondam: ao Conde, e se vocês não fizerem isso, vão todos ser mortos." O gato foi ainda além. As pessoas o examinavam e porque ele parecia tão admirável, e como se uma pessoa de botas por lá passasse, elas o temiam. Ele chegou logo ao castelo do Feiticeiro, entrou e apresentou-se audaciosamente diante dele. O Feiticeiro o olhou com desdém e perguntou-lhe, o que ele queria. O gato fez uma reverência e disse: "Ouvi dizer, que você de acordo sua vontade poderia se transformar em qualquer animal; no que concerne a um cachorro, raposa ou também um lobo... Nisso eu provavelmente acreditaria... Mas num elefante! Isso me parece muito impossível, e por isso eu vim aqui e para me surpreender a mim mesmo". O Feiticeiro disse orgulhoso: "Isso para mim é uma ninharia," e num piscar de olhos se metamorfoseou num elefante; "Isso é muito, mas também em um leão?" - "Isso também não é nada," disse o Feiticeiro e parou como um leão em frente ao gato. O gato ficou chocado e gritou: "Isso é inacreditável e jamais ouvido. Algo assim, nunca me veio, nem em sonhos nem em pensamento; mas ainda mais do que todo o resto seria se você pudesse se transformar em um animal tão pequeno quanto um rato. Você pode certamente mais do que qualquer outro feiticeiro do mundo, mas isso seria demais." O Feiticeiro estava tão cordial com as palavras doces e disse: "Oh, sim, querido gatinho, isso eu consigo também" e pulou como um rato por todo o cômodo. O gato foi atrás dele, prendeu o rato com um pulo e o devorou.

Mas o rei passeava mais longe com o Conde e a Princesa, e chegou a um grande campo. "A quem pertence o feno?" perguntou o rei - "ao Senhor Conde" - gritaram todos, como o gato havia ordenado. – "O senhor lá tem um belo pedaço de terra, Senhor Conde," ele disse. Depois chegaram a um grande campo de centeio. "Hei, pessoal, a quem pertence o centeio?" - "ao Senhor Conde." - "Ai! Senhor Conde! grandes e belas terras!" - Daí para a floresta: "Hei, pessoal, a quem pertence essa madeira?" - "Ao Senhor Conde." - O rei se maravilhou ainda mais e disse: "O senhor deve ser um homem rico, Senhor Conde, eu não acredito, que eu tenha uma tão esplendorosa floresta." Finalmente chegaram ao castelo, o gato estava sobre as escadas, e quando o carro parou abaixo, ele saltou, abriu a porta e disse: "Senhor Rei, o Senhor chegou aqui ao castelo de meu senhor, do Conde, essa honras o farão feliz por toda sua vida." O rei desembarcou e maravilhou-se com o esplendoroso prédio, que era quase maior e mais bonito que o seu castelo; o Conde, porém, conduziu a Princesa escada acima e pelo salão, que cintilava a ouro e pedras preciosas.

Assim, a Princesa foi prometida ao Conde, e quando o rei morreu, o Conde foi rei e o gato de botas, entretanto, Primeiro Ministro.

Um comentário:

  1. He, he, he... que gato esperto, heim??? Parabéns pela bela tradução!!! Continue se aprimorando cada dia mais no que gosta e lhe da prazer, André!!! E nós, aqui, sempre aguardando novos textos!!!

    ResponderExcluir